21/02/2009

PERFIS: TELÊ SANTANA. Por Juca Kfoury

Morreu um brasileiro de primeira
Juca Kfoury
Morreu um grande brasileiro. Tão grande que um dia, logo depois da derrota da seleção na Copa de 1982, o jornalista Alberto Dines, de raros elogios, pediu para publicar um texto na revista "Placar".
O título da matéria, para a surpresa geral, era: "Telê Santana para presidente". O Brasil começava a sair dos anos de chumbo da ditadura e, tanto quanto o time de Telê, o técnico encantava.
Porque Telê Santana sabia perder e sabia ganhar. Era, também, um conservador, de rígidos padrões éticos.
O que combinava com deliciosos casos que contava como poucos, piadista incorrigível. O doutor Sócrates, por exemplo, que, como o irmão Raí, jogou seu melhor futebol sob o comando dele, diz que a primeira impressão que teve ao conhecê-lo foi a de que estava sendo apresentado ao próprio pai, outra figura inesquecível, o seu Raimundo.
Telê um dia revelou que gostaria de ver os jogos dos times que dirigia das arquibancadas, ao lado da torcida. Porque, assim, poderia avaliar se os atletas estavam executando o que treinaram e se agradavam aos que pagaram ingresso para vê-los. Ele tinha a exata consciência de seu papel, como o do promotor de espetáculos que respeita os consumidores.
Sobre ele, Zico disse ter sido o único técnico de quem jamais ouvira uma ordem para bater no rival. O único.
E foi Telê quem, irritado com as jogadas dos cartolas, afirmou: "O futebol não é coisa para gente séria".
Não há dúvida de que, independentemente do mau atendimento emergencial que teve ao sofrer seu primeiro acidente vascular, muito de seu mal teve a ver com o estado de indignação que se apossou dele e o envenenou diante de tantos desatinos que viu de perto.
A ponto de, no São Paulo, onde sagrou-se bicampeão mundial, protestar quando via seus comandados viajarem na classe econômica e os cartolas, na primeira.
Pois, agora, Telê Santana se vai. De primeira. Imortal.

(Folha de S. Paulo, 22.04.06)

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