Sábios velhinhos
Tostão
UMA DAS coisas mais intrigantes do futebol é o fato das principais regras terem sido estabelecidas há mais de 120 anos.
Uns dez ingleses, reunidos diariamente em um pub de Londres, provavelmente bêbados, estabeleceram as 17 regras. Continuam atuais e corretas.
Com frequência, ouço e leio críticas irônicas e preconceituosas aos "velhinhos do International Board", que decidem os detalhes que possam ou não ser mudados. Os "velhinhos" demoram para mudar, mas, quando decidem, costumam acertar em cheio, como a vitória valer três pontos e a proibição do goleiro segurar a bola com as mãos, quando houver intenção do companheiro de atrasar a bola com os pés.
Com a alegação de que o futebol ficou mais veloz e que os jogadores ocupam mais espaços, muitos pedem mudanças radicais, como acabar com o impedimento, diminuir o número de jogadores, aumentar o tamanho do gramado e a altura das traves. Seria um desastre.
Há mais de dez anos, comentei um jogo pela TV entre os reservas de dois grandes times de São Paulo. A partida, sob a observação dos "velhinhos", servia de teste para acabar com o impedimento. Os atacantes corriam para dentro da área e os zagueiros iam atrás. Ficava um enorme vazio no meio-campo. Ficou horrível. Parecia outro esporte. Os "velhinhos", sabiamente, vetaram.
Na semana passada, queriam adotar um novo cartão, o laranja.
O jogador teria que sair por algum tempo para voltar, como acontece em alguns esportes.
Se os árbitros, a imprensa e os torcedores não entram em acordo se um atleta mereceu o cartão amarelo ou o vermelho, imagine a confusão com mais um cartão. Os "velhinhos", sabiamente, vetaram.
Queriam ainda passar o intervalo para 20 minutos. Só seria bom para as TVs venderem mais anúncios comerciais. Os "velhinhos", sabiamente, vetaram.
Isso não significa que nada deva ser mudado. Sou a favor de aumentar o número de substituições, principalmente se houver prorrogação, de punir jogadores e equipes que ultrapassarem um limite de faltas, do uso da tecnologia em pouquíssimas situações especiais, como saber se a bola entrou no gol ou não, de a bola só sair do jogo se tocar no chão.
Nesse último caso, beneficiaria o jogador habilidoso que bate o escanteio de curva, com a bola saindo do campo e caindo dentro da área. Mas e se a bola entrasse no gol e saísse sem tocar no chão? Seria gol?
Há muitas controvérsias. Na teoria, seria bom colocar mais um auxiliar atrás de cada gol. Mas tenho dúvidas se não vai haver confusão entre o árbitro e os auxiliares. Uma boa teoria nem sempre é confirmada na prática. Os "velhinhos", sabiamente, adiaram a decisão.
Deixem os "velhinhos" trabalharem com calma.
Eles sabem o que fazem.
(Folha de São Paulo, 04.03.09)
Ilustração: Velhinhos da International Board: Ruins de bola e bons de regras.
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